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BCAA: Você está usando errado

O marketing da suplementação fica a cada dia mais pesado e, diante de tantas opções de marcas, formas (pó, cápsulas, líquido, etc.), quantidade e informações nutricionais, muitas vezes surgem grandes dúvidas sobre qual suplemento escolher. Os aminoácidos BCAA são uma das formas que a indústria de suplementação tem investido bastante, dedicando sua publicidade e tentando ganhar maior visibilidade. Mas será estes suplementos são mesmo efetivos no que propõem? Vale mesmo a pena compra-los? Abaixo, segue um artigo que levanta pontos interessantes sobre essa discussão.

Artigo postado no site Hipertrofia.org e escrito pelo usuário com nick Craw69 (foram feitas apenas correções ortográficas e referentes a pontuação, preservando o texto na íntegra)

I - Sobre a dosagem (e as influências do mercado de suplementos nesse quesito)

Minha maior revolta com 90% das pessoas que usam BCAA (assim como as recomendações de empresas nacionais e algumas internacionais) é em relação à dosagem do mesmo. Não é raro (alias, é o mais comum) ver recomendações de rótulos citando: "Dosagem recomendada: 2 cápsulas antes e 2 cápsulas depois do treino." e muito menos (raro) ver pessoas citando que usam este tipo de dosagem. Mas qual o problema com ela? Explico: ela é completamente inútil. Ok, não expliquei nada; mas vamos lá. Vou usar dois suplementos para apoiar minha argumentação: 3 Whey Protein - Probiótica (900g - R$ 102) e BCAA Plus - Probiótica (120 caps - R$ 61,50) . Escolhi ambos por serem comuns e na média de preço do mercado nacional; também usei o site da CorpoPerfeito simplesmente por ser popular.
Primeiramente, quero citar a necessidade do mercado de suplementação fazer algo apelativo não só em resultados, mas financeiramente também. Vamos supor que alguém lançasse um BCAA que dure 5 dias de uso e custasse R$ 61,50. Alguém compraria? Não, fim de papo. Portanto a primeira coisa que eles têm que fazer é: criar um suplemento que dure algo entre 21-30 dias, PELO MENOS.
Em segundo lugar, que na verdade é uma continuação do primeiro, trata sobre a necessidade das empresas lançarem algo que não só dure bastante, como não tenha um custo absurdamente alto. De nada adianta o suplemento durar 30 dias se custar R$ 500.
A terceira coisa que precisamos entender é: eles precisam mexer com o psicológico da pessoa; mais especificamente falando, eles não podem fazer um pó que não dure nada. Qual a saída? Cápsulas. Coloque algo em capsulas que é MUITO mais fácil você mexer psicologicamente com o cliente. A maioria dos BCAAs tem caps de 750mg, o que significa que para atingir 5g BCAA, são necessárias 7 caps aproximadamente. Veja, é a mesma coisa dizer que você toma 7 caps ou 5g BCAA. Porém, se você tomar 5g BCAA antes e depois do treino, o pote acaba extremamente rápido; e as pessoas não iriam se sentir ‘assustadas’ por estarem tomando 10g de um suplemento. Transforme isso em cápsulas e as pessoas se apavoram; imagine que alguém vai tomar 14 caps por treino? Isso é um absurdo! MEU DEUS, VAMOS TODOS MORRER! Percebem? É mais fácil enfiar na cabeça da pessoa que ela deve tomar 10g de algo ou 14 caps? 10g, com certeza; o que não é bom para a empresa já que o pote acabaria rápido demais. Você usa 30g de whey, qual o problema em usar 10g de BCAA? Agora, cápsulas... cápsulas lembram remédios, remédios lembram problemas que devem ser evitados, logo cápsulas devem ser evitadas... imagine sua mãe chegando em casa e te ver tomando 14 capsulas de uma vez? Ela vai te matar, certeza. Imagine sua mãe te ver tomando uma ou duas colherezinhas de chá: ela vai achar muito mais normal. Enfim, acho que deu pra entender.
Agora, para colocar na prática tudo isso, alguns números:
- 900g do whey citado custam R$ 102. Um pote de BCAA custa R$ 61,50 e ambos duram cerca de um mês. Mas quantos gramas de BCAA temos naquele pote? (e a maioria nunca parou pra pensar nisso). Cada capsula tem 800 mg, como são 120 no total: 120 x 800 = 96.000 mg = 96g de BCAA. Ou seja, com R$ 61,50 você compra uma quantia equivalente a pouco mais de 10% de seu whey, mas vamos usar 10% pra comparação: enquanto 900g de whey custam R$ 102, para se ter 900g de BCAA da mesma marca iriamos gastar R$ 615. A conclusão aqui é, sem ser culpa da Probiótica: BCAA é naturalmente muito mais caro do que Whey. Independente de o Whey e o BCAA serem marcas caras ou ‘bulk’ (como Hilmar, Growth etc), essa proporção de preço costuma ser exageradamente desbalanceada. Isso obriga as empresas a lançarem os BCAAs em potes de pequenas quantidades, e assim temos a aplicação prática da primeira citação: a necessidade de lançar algo apelativo financeiramente.
- Aplicando a segunda e a terceira: para um suplemento de 100g que deveria ser usado no MÌNIMO 5g/dia (vou falar sobre isso depois), pagar no MÌNIMO R$ 61,50 a cada 20 dias é um absurdo para a maioria das pessoas, principalmente por ser algo que dificilmente terá resultados. Qual a solução? Recomende uma dose baixa (assim o suplemento dura bastante tempo; e a falta de resultados não é problema pois o efeito placebo cuida disso) e coloque em caps (assim ninguém reclama de estar usando apenas 1-2g de algum pó, e sim 2-4 caps que é uma quantia razoável dentro do padrão da maioria)... pronto: criamos um suplemento que dura o tempo padrão (30 dias), com uma dosagem baixa compensando o preço alto e ainda ninguém questiona os efeitos principalmente pelo psicológico (já que o marketing pesa, a fé no produto é grande, o efeito placebo é supremo e 2-4 capsulas é uma quantia razoável).

II - Sobre os efeitos e utilidades, assim como as dosagens necessárias

Resumidamente, você pode ter 3 objetivos ao utilizar a suplementação com BCAA:

1) Aumentar síntese proteica (de forma simples: o corpo aproveita melhor as proteínas; se antes você tomasse 45g de whey, e o organismo - por exemplo - "desperdiçasse" 15g, com a síntese protéica elevada você aproveita as 45g totais);

2) Quebrar o efeito do catabolismo (jogue aminoácidos na corrente sanguínea e o corpo não tenta utilizar os AAs já sintetizados como fonte de energia, já que o BCAA da corrente sanguínea já está de ‘mais fácil acesso’)

3) Auxiliar recuperação muscular assim como propriedades anabólicas (possível aumento de força, recuperação mais rápida, facilidade de aumento muscular, etc.)

A maioria das pessoas utilizam o BCAA com a finalidade 3, uma outra grande parte usa como finalidade 2 e a minoria sequer sabe da existência (ou entendem como ela funciona) da funcionalidade 1.
A questão é: o quanto é efetivo para se atingir cada objetivo?

1) Todas pesquisas recentes em relação a isso mostram que é necessário algo entre 3 a 5g de leucina para se ter um aumento de síntese proteica. Como os BCAAs são, geralmente, 2:1:1 (a cada 4g, 2g são leucina, 1g isoleucina e 1g valina), isso significa que com 5g BCAA você já provavelmente vai ter algum aumento de síntese proteica.

2) A quebra de catabolismo é mais simples e pode ser atingida com algo entre 5-10g usadas 30 mins antes, durante ou imediatamente após o exercício.


3) Aqui entra o problema. O único estudo* feito com BODYBUILDERS naturais (não com ciclistas e outros tipos de atletas, como é comum ver) e que comprova a eficácia do BCAA, nesse sentido, recomenda 0.44g/kg usado antes, durante e após o treino; este é o estudo que o Charles Poliquin (treinador muito famoso), M. DiPasquale (autor da dieta anabólica) e Justin Harris assim como Eric Serrano (nutricionistas tops na área de pesquisa) referem-se ao recomendar o uso de BCAA. Caso alguém não tenha percebido, é uma dose MUITO alta: para uma pessoa de 75kgs, são recomendadas 33g dividas entre pré/intra/pós treino. Isso significa que aquele BCAA de R$ 61,50 acabaria em 3 dias de treino e que seriam necessárias 40 caps aproximadamente por treino. Devido a esse alto CxB, o mínimo que os treinadores/nutris citados recomendam são 20gs distribuídas entre pré/intra/pós treino para esse objetivo, mas o correto ainda seria utilizar a equação de 0.44g/kg ou algo próximo de.

* tal estudo, por ser italiano, é de difícil acesso. O abstrato do mesmo cita que houve aumento de forca, recuperação e massa muscular no grupo que utilizava a dosagem citada de BCAAs; porém sem a pesquisa na integra, é complicado afirmar até que ponto essas melhoras foram significantes ou não, ou ainda, se o estudo não era falho de alguma forma.

Portanto, seguindo a recomendação de 2-4 caps de um BCAA padrão, o que equivale a 2-3.5g de BCAA, pode-se dizer cientificamente ser uma dose que não serve pra nada eficientemente. Não existem estudos mostrando resultados decentes com qualquer dosagem abaixo de 5g, e mesmo os resultados mostrados com 5g são relativos pois eles em geral tratam de outros atletas que não são bodybuilders/treinados frequentemente com altos pesos.

III - Sobre a quantidade de BCAA em outros suplementos/alimentos

Aqui é outra coisa engraçada. Simplesmente porque os wheys costumam citar quantas gramas estes tem de BCAA, a galera acredita que whey é a única fonte de BCAA do mundo. É bem divertido ver galera dizendo "Meu whey já tem 5.5g de BCAA então já tenho bastante e não preciso suplementar! ‘simplesmente porque: 1) eles não tem noção do que é ‘bastante BCAA’ e 2) eles não sabem que qualquer proteína completa tem BCAA.
A maioria das carnes tem algo entre 15-20% de suas proteínas compostas por BCAA. Isso significa que a cada 20g de proteína de carne, você tem algo entre 3-4g de BCAA. 2 ovos cozidos (bem cozidos, com a gema dura) tem 2.5g BCAA. Até amendoim (se não me engano, 150g tem 4g BCAA) tem estes aminoácidos; e por que ninguém fica dizendo ‘Minha carne já tem bastante BCAA então não preciso usar suplementos?
Eu expliquei isso apenas para mostrar outra coisa: Custo x Benefício. Supondo que você compre o BCAA usado no exemplo do tópico e use 4 capsulas antes do treino, nós temos 3g BCAA. O custo é alto, como já provado (o kg de BCAA em geral custa 6x mais do que o kg de whey, seja whey Probiótica ou whey Hilmar/afins), então porque simplesmente não usar metade de um scoop de whey? Porque não comer dois ovos ou então um bife de carne? Acho que deu para entender a idéia. Se for pra usar 4-8 caps por dia, simplesmente use um scoop a mais de whey que é a mesma quantidade de BCAA e 6x mais barato, assim como comer 2-4 ovos.

IV - Vale a pena usar BCAA?

Esta é uma pergunta que frequentemente é feita, porém frequentemente também são dadas respostas baseadas em nada além de achismo, opiniões pessoais viciadas ou falsos dados. Vou tentar rapidamente expor tanto o lado científico quanto prático acerca de tal tema.

1) O aumento de síntese protéica através do uso de BCAA (e, especialmente, leucina) é comprovado. Nisto não há divergências; a síntese protéica aumenta e ponto. A questão é: essa síntese protéica resulta em alguma melhoria prática? Ou ainda: faz qualquer diferença? Para fins de ganhos de massa muscular, uma simples elevação da sint. prot. não é garantia de maiores ganhos de músculos. Mais do que isso, existe o problema do contexto: muitos estudos mostram o aumento, mas a maioria não está considerando pessoas que já ingerem altas quantidades de proteínas por dia (2g/kg para mais) ou então são feitos em jejum. Portanto, para uma pessoa que já está ingerindo 150g + de proteína por dia e comendo frequentemente (eliminando períodos notáveis de jejum), dificilmente haveria um ganho muscular extra pela simples adição de 5-15g de proteína (BCAA/leucina) ao longo do dia. Na pratica, também é algo MUITO difícil de avaliar: como saber se você está tendo ganhos simplesmente pela adição de BCAA/leucina antes da refeição? Conclusão: a melhora na síntese protéica não é tão útil para quem já come proteínas adequadamente, assim como dificilmente é algo notável na prática. Logo, a adição do aminoácido ao longo do dia até é valido para arriscar algo, mas está longe de ser algo garantido.

2) No caso do catabolismo, novamente existem problemas: a maioria dos treinos realizados não são em jejum, sempre havendo uma refeição pré. Se a refeição pré é feita de forma correta, certamente por 3-4h o catabolismo será nulo, tanto pelos níveis elevados de insulina como a presença de proteínas sendo digeridas (e consequente liberação de aminoácidos). No caso de aeróbicos em jejum, a intensidade também não costuma ser alta para ameaçar uma perda de fibra muscular em si; além de, devido a tanto o BCAA quanto a leucina terem uma resposta insulinêmica significante, existir a probabilidade do ambiente hormonal (baixa insulina, alta catecolamina, alto GH...) ser estragado e anulando os - possíveis - benefícios do aeróbico no estado de jejum. No caso dos treinos com pesos feitos em jejum, a adição já é mais útil pelo catabolismo ser mais preocupante. Conclusão: caso exista uma refeição pré-treino, o uso do BCAA para catabolismo se torna totalmente desnecessário; já se o treino for feito em jejum... com pesos é muito valido e recomendado; porém no aeróbico corre-se o risco de perder o ambiente hormonal que o distingue do aeróbico comum.



3) O ponto mais preocupante de todos. A base cientifica é praticamente inteira contraria as tais possibilidades por diversos motivos: maioria dos estudos, como citado, são feitos com atletas alheios ao treino com pesos; maioria dos estudos é feita com pessoas que não estão ingerindo boas quantias de proteínas OU que estão em um estado de desbalanço calórico; maioria dos estudos analisa os benefícios a curto prazo, mas não prova que a médio-longo (4 semanas ou mais) faça qualquer diferença. Para não alongar mais: existe um estudo (o italiano que cito) que aprova, porém o mesmo necessita ser validado; logo, cientificamente, para fins de ganhos anabólicos, o BCAA não serve para muita coisa. Mas como sempre existe o nosso ‘porém’, aqui vem ele: é extremamente raro ver alguém que adicione 15-30g de BCAA pré/durante treino e não sinta vantagens, principalmente no quesito recuperação muscular. Conclusão: se a pessoa prefere acreditar na ciência, não utilize. Se a pessoa prefere acreditar nos relatos práticos, experimente.
Em resumo: vale a pena o uso, garantidamente, para quem treina com pesos em jejum. Para outros contextos de treinos (como aeróbicos ou quando existe uma refeição pré) não se tem vantagens ao fazer uso pré/intra/pós e ainda corre-se o risco de perder benefícios do treino. No caso da síntese proteica, é um tiro no escuro e ter fé para que melhore alguma coisa. Para o terceiro objetivo, depende da pessoa preferir a ciência (que é contraria, apesar de pouquíssimos estudos terem analisado altas dosagens de BCAA ao redor do treino) ou a prática (que tem muito mais relatos positivos do que negativos).

V – Conclusão

Fazendo uma síntese de tudo o que eu disse, concluímos que, ao fazer o uso de 2-4 caps por dose (1.5-3g/dose):

- Não existem estudos e/ou objetivos que possam ser atingidos com essa dosagem para um atleta que faz treinos pesados e frequentes com pesos;
- Não existe vantagem econômica, pois, como citado, pode-se atingir a mesma quantidade de BCAA com uma fonte pelo menos 6x mais barata;

- Não existem motivos óbvios para fazer uso de tal suplementação com tais dosagens. As únicas situações nas quais seria interessante o uso de 4-8 caps, de uma única vez, seria para estimular síntese proteica (na fé de que isso represente algo) ou para evitar o catabolismo. Porem, mesmo no caso da síntese proteica, temos uma opção com efeitos iguais e muito mais barata: leucina isolada; que chega a custar 50-70% a menos do que BCAA.

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